terça-feira, 1 de maio de 2012

Ingrediente-chave para a receita de desenvolvimento da gastronomia: as relações humanas numa empresa chamada... Restaurante




 
Em setembro de 2011, um grupo de chefs, o “G9”, integrantes do Conselho Consultivo da Fundação Centro Basco de Culinária (Basque Culinary Center), reuniu-se para redigir o que se denominou “Declaração de Lima”, uma carta aberta aos futuros chefs. O texto inicia-se com o seguintes dizeres: “Nestes novos tempos em que a sociedade está em constante evolução, nossa profissão deve responder ativamente aos novos desafios.” Na compreensão destes chefs, os desafios abrangem 4 esferas de relacionamento: a natureza (prática de sistema de produção sustentável que permita a manutenção e criação de sabores e preparações culinárias), a sociedade (através de legado de sabores, hábitos alimentares e técnicas de cozinha, influenciar o desenvolvimento sócio-econômico de outros), o saber (colaborando com especialistas na área de saúde e educação, transferindo esse conhecimento para o público, ajudando-o a adquirir bons hábitos) e os valores (guiar-se pelos princípios éticos para auto-realização).

Nessa narrativa única de compreensão do trabalho, que envolve profissionais originários de países com “ecodinâmicas” gastronômicas tão diversas como de Dinamarca, Peru, França, Brasil ou Estados Unidos, duas questões são apontadas: a questão da “evolução” e a possibilidade de realizá-la através das “relações” que os profissionais estabelecem com as diversas esferas circunscritas. A primeira questão seria então, como determinar o que seriam “os meios” e “os fins” nessa Declaração? E a segunda, como buscar um caminho para viabilizar esta “resposta ativa” dos chefs para a evolução?


Pesquisadores e teóricos da área de Gastronomia possuem ainda, segundo artigos coletados abaixo, uma visão de gestão de RH baseada em modelos estruturais e lineares, de fomento de programas de qualificação de seus profissionais.


Na visão de Chang, Gong e Shum, “inovação” é o resultado da combinação de ações que envolvem a contratação e a formação interna de profissionais de competências múltiplas para atendimento a clientes (funcionários de primeira linha, aqueles que estão em contato direto com seus clientes). Este resultado representa uma melhoria e também, inovação radical (geralmente associadas a tecnologia) em empresas de da área de Hospitalidade (CHANG et al, 2003). Entende-se que o investimento interno para qualificar seria uma forma de responder a evolução das demandas externas, abordando apenas uma das esferas identificadas pelos chefs, porém ponto-chave no mercado pesquisado pelos autores (hospitalidade e foodservice chinês).


Uma outra compreensão sobre inovação é o desenvolvimento de competências através da educação e tecnologia. Segundo Hu, a educação culinária moderna “forma artistas culinários com talentosos desempenhos capazes de usar a sua imaginação, intuição, intelecto, emoções, esforço físico e sensoriais”. Complementa citando uma outra pesquisa que a “inovação e tecnologia em hospitalidade proporcionam aumento das receitas, redução de custos e aumento da vantagem competitiva” (WANG & QUALLS, 2007 apud HU, 2010). Para o autor, desenvolver programas de formação inovadoras baseadas na competência e/ou critérios de elegibilidade de recompensas poderá melhorar a experiência culinária para clientes e a qualidade da indústria alimentícia (HU, 2010). Como uma complementação do Chang, Hu destaca a questão da tecnologia como um fator associado a competência.

Já no tradionalmente aclamado mercado francês e o seu Guia Michelin, Ottenbacher e Harrington realizaram uma pesquisa sobre como chefs estrelados compreendem a questão do processo de desenvolvimento de inovações – comparando esta com os modelos teóricos. Os resultados da pesquisa indicaram que o processo de desenvolvimento, segundo chefs, têm semelhanças e diferenças em relação a conceitos tradicionais teóricos. Inovações, segundo Michelin, não incluem uma análise de negócios. Para os chefs, a prestação de serviços para proporcionar um jantar agradável desempenha um papel mais importante na Gastronomia do que a inovação nos produtos e negócios. (OTTENBACHER & HARRINGTON, 2007).


No âmbito das estruturas organizacionais das empresas de foodservice, a pesquisa desenvolvida por Julia Lane e outros autores (que considerou estudo de casos e dados quantitativos em sua metodologia) conclui que:


1 - As empresas ainda acham que é necessário manter e integrar porções significativas da sua força de trabalho em consagrados setores internos de trabalho;


2 – as oportunidades tanto externas quanto internas para trabalhadores menos qualificados e com baixa formação escolar ficaram mais restritas (LANE et al, 2003).


Neste artigo, alocar profisisonais qualificados em processos chaves, garante a competitivade para acompanhar as evoluções do mercado.


Em seu texto “Explaining the performance of RHM”, Fleetwood e Hesken, citando Rynes, sugere que a abordagem para compreender o desempenho dos recursos humanos deve empregar métodos alternativos como estudo de casos e etnografia visando obter uma melhor ressonância entre os profissionais e os acadêmicos. Porém, como demonstram os artigos selecionados, a área carece de uma visão que permita o enquadre das dimensões traçadas pelos chefs do G9. Uma somatória das abordagens realizadas nos artigos parece indicar que a Escola Configuracional (o paradigma do “cubo mágico”) - que entende que “constelações multidimensionais” das características conceitualmente distintas ocorrem simultaneamente - poderá oferecer a área de estudos de gestão de RH em Gastronomia, caminhos e instrumentos para compreender os feixes (ou esferas, da Declaração) de práticas inter-relacionadas de ações.






Referências Bibliográficas:
 • ADRIÀ, F., ET AL, “Declaração de Lima”, 2001. Disponível em http://www.estadao.com.br/noticias/suplementos%20paladar,o-nome-desta-receita-e-alianca-gastronomica,4657,0.htm, acessado em novembro de 2011


• Chang, S., Gong,Y., Shum, C. “Promoting innovation in hospitality companies through human resource management practices”, em International Journal of Hospitality Management, maio, 2003. (disponível em http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S027843191100003X, acessado em março, 2012).


• FEETWOOD, S., HESKETH, A., Explaining the performance of HRM, Cambridge University Press, 2010.


• HU, M. L., “Discovering culinary competency: an innovative approach” em Journal of Hospitality, Leisure, Sport and Tourism Education, Vol. 9, No. 1, abril, 2010. (disponível em: http://www.heacademy.ac.uk/assets/hlst/documents/johlste/vol9no1/06PP0227HuFormat_final65to72.pdf, acessado em junho, 2011)


• LANE, J., MOSS, P., SALZMAN, H., TILLY, C., “Too Many Cooks? Tracking Internal Labor Market Dynamics in Food Service with Case Studies and Quantitative Data”, em Low-Wage America: How Employers Are Reshaping Opportunity in the Workplace, Russell Sage, New York, 2003


• OTTENBACHER, M., HARRINGTON, R. J., “The innovation development process of Michelin-starred chefs” em International Journal of Contemporary Hospitality Management, Volume: 19, Issue: 6, Publisher